23 outubro 2007

O Tratado de Lisboa

Que orgulho, um Tratado de Lisboa...

A partir de agora, nas escolas e universidades de todos os países da Europa, depois dos Tratados de Roma, Maastricht, Amesterdao e Nice, os estudantes vao passar a ter que se debruçar também sobre o Tratado de Lisboa.

E é destes pequenos "achievements" que se vai construindo a imagem do nosso país lá fora, é com estas pequenas vitórias que Portugal se afirma como uma das grandes naçoes europeias. Se nao a nível de território e populaçao, pelo menos a nível de liderança, capacidade de trabalho, destreza negocial e vocaçao para gerar consensos.

E nao foi nada fácil gerá-los desta vez. Apesar do mandato claro que a presidência portuguesa tinha recebido por parte de todos os chefes de Estado reunidos no Conselho Europeu de Junho, na Alemanha, para a elaboraçao de um novo tratado que substituisse o defunto Tratado Constitucional, algumas das naçoes vinham com vontade de estragar a festa a Portugal.

A Bulgária queria utilizar o alfabeto cirílico para chamar "evro" à moeda única, a Áustria queria limitar a livre circulaçao de estudantes estrangeiros candidatos às suas universidades, a Itália queria mais um deputado no Parlamento Europeu e a Polónia (sempre a Polónia!) queria consagrar o compromisso de Ioannina como anexo ao tratado.

Foi preciso, por isso, apelar aos nossos melhores dotes de negociaçao (e já agora também àquele dote que nos fez famosos no mundo inteiro, o do "desenrascanço") para conseguir resolver estas contas de mercearia e conseguir que no final ficassem todos satisfeitos.

A soluçao encontrada para a questao da Itália, por exemplo, é de um brilhantismo excepcional e só podia ter ocorrido a portugueses: "Ai a Itália quer mais um deputado? Mas nao podemos passar o tecto dos 750. Bom, entao dá-se o deputado à Itália e o Parlamento passa a ter nao 751 deputados mas sim 750 mais o presidente." Genial!

A única mágoa que tenho (nao é mágoa, vá, é apenas pena) é que o tratado que será assinado a 13 de Dezembro nao seja sobre algo que afecte a vida das pessoas e sim sobre questoes internas de funcionamento e organizaçao da UE. É certo que foi decisivo para que finalmente se possa falar no fim da crise institucional que a Uniao atravessava há já alguns anos e isso, claro, é muito importante para que a Europa possa funcionar a 27 (em vez de a 15, como estava habituada), decida mais rapidamente, fale a uma única voz em questoes de política externa e sobretudo avance no caminho da prosperidade e pleno emprego prometidos na Estratégia de Lisboa.

Está certo, o Tratado de Lisboa nao consagrará no seu conteúdo nenhuma deliberaçao sobre as questoes mais prementes das sociedades actuais: pobreza, desigualdade, discriminaçao ou desemprego. Nao ajudou as famílias que se debatem com o problema de fazer face ao aumento das taxas de juro que pesam e muito sobre os seus orçamentos. Nao disse nada sobre o ambiente e a situaçao insustentável em que nos encontramos. Nem sequer disse nada sobre a necessidade vital de se erradicar o tabaco de todo e qualquer sítio público de uma vez por todas.

Mas é uma base, um ponto de partida. Se voltarmos a falar a uma mesma voz, se resolvermos as nossas questoes internas e formos mais rápidos a decidir, de certeza que todas as questoes anteriores nao ficarao sem resposta. Pelo menos, é essa a minha esperança.

E vamos sempre poder dizer que tudo começou em Lisboa...